Apenas no que refere a Canoas, foram devolvidos R$ 153 milhões. O dinheiro já estava disponível na Caixa Econômica Federal e serviria para concluir as obras locais de esgotamento sanitário. A denúncia foi feita pelo Sindiágua, o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgoto/RS ao Ministério Público de Contas do Estado (MPC-RS) e também ao Ministério Público Federal (MPF).
O diretor do Sindiágua, Rogério Ferraz, observa que até 2014, o governo do Estado, na época Tarso Genro, assinou contratos com a União no valor de R$ 4,4 bilhões para obras de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Somente numa ocasião, foram firmados acordos com o Ministério das Cidades no valor de R$ 521,9 milhões. Montante direcionado para nove cidades da região metropolitana sendo que, para Canoas, o valor foi o mais significativo: R$216 milhões, a serem usados na ampliação do sistema de esgotamento sanitário. “Toda esta verba veio a fundo perdido, isso é, sem nenhum ônus para o Estado”, acentua.
De acordo com Ferraz, com o cancelamento das licitações das outras etapas, a Caixa suspendeu todo o repasse do restante do dinheiro para as nove cidades, chegando ao valor de R$ 233 milhões. “Além disso, a Corsan, como não levou adiante todo o projeto, dá para afirmar que o prejuízo total chega a RS 521,9 milhões”, diz ele. E enfatiza: “Para um estado que afirma não ter recursos, perder esta quantia é um despropósito”.
Faltou projetos
No final do governo Tarso estavam prontos os projetos com as primeiras etapas e já aprovados pela Caixa. Para receber o resto do dinheiro, a Corsan, a Companhia Rio-grandense de Saneamento, deveria elaborar projetos e orçamentos e enviar à Caixa para aprovação. As licitações da primeira etapa das obras estavam até com data marcada. Ocorreriam em junho de 2015. Caso fosse seguido aquele encaminhamento, Canoas alcançaria o índice de cobertura de esgotos tratados de 70%, considerado ótimo pelas autoridades sanitárias.
Em vez disso, porém, a Corsan, obedecendo a linha do novo governo, optou pela privatização da gestão de esgotos através de PPPs, as parcerias público privadas. Para justificar a falta de recursos, devolveu aqueles R$ 153 milhões ao Ministério das Cidades. É o que comprova o ofício nº 24/2017 da pasta remetido à Superintendência Nacional de Transferência de Recursos Públicos da Caixa.
TCE abre auditoria especial sobre a PPP
Uma Auditoria já foi deflagrada pelo Tribunal de Contas do Estado a pedido do Ministério Público de Contas. O MPC emitiu parecer sobre a PPP. De sua parte, o MPC emitiu parecer sobre as contas da Corsan de 2015. No documento, afirma que “as irregularidades antes descritas revelam a prática de atos administrativos e de gestão contrários às normas de administração financeira e orçamentária”. Repara ainda que tal fato acontece “especialmente em relação às deficiências verificadas nos procedimentos licitatórios (contratações emergenciais) e a morosidade na implantação e ampliação dos sistemas de esgotamento sanitário, com a dificuldade em atender as demandas de engenharia junto ao financiador Caixa Econômica Federal”. Registra ainda “a fragilidade dos projetos apresentados, e se reveste de relevância bastante para ensejar a irregularidade das contas”.
Segundo Ferraz, é isto “exatamente o que a Caixa e o Ministério as Cidades vem dizendo: os recursos estão sendo perdidos em decorrência dos projetos que, “ou não foram apresentados ou, quando apresentados, são tão deficientes que não conseguem aprovação”.
Aconteceu que a direção da Corsan suspendeu os editais de licitação das primeiras etapas das obras do PAC e não enviou os projetos das etapas seguintes. Com isso, deixou de receber R$ 233 milhões para as nove cidades, gerando um prejuízo direto de R$ 521 milhões já assinados e contratados pela administração anterior.
Cálculos do Sindiágua indicam que a capacidade de arrecadação nas nove cidades da PPP, após concluídas as obras do PAC, ultrapassará R$ 10 milhões mensais. E este será o grande trabalho da empresa privada participante: arrecadar os recursos. Isto porque, a maior parte das obras já foi realizada com recursos públicos. Cidades como Esteio já tem 90% da obra concluída, enquanto Cachoeirinha e Gravataí contam com 70% finalizados.
Em agosto passado, os vereadores de oposição em Canoas conseguiram barrar a votação que aprovaria a PPP. A votação ocorrerá após as investigações dos ministérios público de contas e federal.
Procurada e questionada sobre a polêmica, a diretoria da Corsan não deu a sua versão dos fatos até o fechamento desta edição.
Este conteúdo foi originalmente publicado na versão impressa (Edição 5) do Brasil de Fato RS. Confira a edição completa.
Edição: Marcelo Ferreira