A proposta de Orçamento da União para 2019 foi enviada, nesta sexta-feira (31), ao Congresso Nacional, onde deve ser avaliada pela Comissão Mista de Orçamento. O Projeto de Lei do Executivo seguiu as linhas postas pela Emenda Constitucional número 95, ou do Teto de Gastos, que congelou as despesas por duas décadas. O Parlamento tem até o último dia do ano para modificar e aprovar o texto.
Para Paulo Kliass, doutor em Economia e especialista em políticas públicas e gestão governamental, a tônica da proposta de orçamento é a consolidação da “austeridade”, ou seja, a ideia de que os problemas fiscais brasileiros se resolveram com a contenção do investimento público, e não com a ampliação da receita.
“Toda análise da restrição, do critério de austeridade, exclui, de forma bem objetiva, as despesas de natureza financeira. Só se trabalha com receitas e despesas primárias. Juros, serviço da dívidas, todas essas despesas estão fora do cálculo, fora da compressão, fora do esforço de austeridade”, explica.
Ele também menciona as negociações da cúpula do Judiciário para escapar dos “sacrifícios” e terem seu aumento salarial incluído na proposta de Orçamento. Kliass entende que o Teto dos Gastos, diante da crescente demanda por serviços públicos pelo próprio incremento demográfico, imporá três alternativas para o próximo presidente eleito, independentemente de orientação ideológica: a revisão da Emenda, sofrer impeachment por descumpri-lá ou respeitá-la destruindo direitos básicos da população.
“Você imaginar que algum candidato do campo conservador ganhar a eleição, ele vai sofrer impeachment. Ele tem um mínimo de obrigação de prestação de serviços públicos. O crescimento vegetativo das despesas da Previdência. Isso faz com que o orçamento tenha que crescer, é impossível cumprir essa regra. Ou então vai se partir do princípio que vai se fechar posto de saúde”, diz.
Reforma Agrária
A consolidação da austeridade no Orçamento de 2019 poderá significar, concretamente, a piora em diversas áreas que já vinham sofrendo cortes, como ações voltadas para a reforma agrária e a agricultura familiar. As verbas provenientes da Secretaria de Agricultura Familiar para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que garante o escoamento da produção, serão zeradas. O programa tem outras fontes de recursos.
O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), que chegou a ter mais de R$ 30 milhões anuais, recebeu cerca de R$ 10 mi em 2018 e, caso a proposta atual de orçamento seja aprovada pelo Congresso, terá R$ 6,5 milhões ano que vem.
As verbas destinadas para desapropriação de terras, que chegaram a R$ 800 milhões em 2015, foram de apenas R$ 83 milhões em 2018, e o previsto para 2019 é R$ 30 milhões. Gerson Teixeira, ex-presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária, diz que o montante é insignificante para a aquisição de novas terras e que o Projeto do Orçamento "não tem absolutamente nada para a reforma agrária" .
“Sinaliza a continuidade do desmonte da política de reforma agrária e para a agricultura familiar. A primeira coisa que chama a atenção é no orçamento do Incra, de R$ 3,8 bilhões. Aumentou 23,4% em relação ao que foi aprovado pelo Congresso para 2018. Mas ao analisar, se vê que todo esse dinheiro extra é para pagar precatório. É um aumento de 146%. Vai para pagar juros compensatórios. Isso, em ano eleitoral, chama a atenção. De repente, está sendo paga uma fatura”, contextualiza Teixeira.
Os juros compensatórios incidem sobre supostos lucros cessantes de latifúndios improdutivos. Sem as políticas públicas, Teixeira prevê que estão em risco não só novos assentamentos, mas também os já existentes. Com a proposta de Temer de titular assentados, o cenário que se desenha é de cada vez mais beneficiários da reforma agrária venderem seus lotes.
Edição: Diego Sartorato