A Comissão Popular da Verdade foi lançada na noite da última quinta-feira (19) em cerimônia aberta ao público no salão nobre da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A comissão tem como objetivo acompanhar de perto e denunciar as violações aos direitos humanos cometidas pelo Exército durante a atual intervenção militar no Rio de Janeiro.
Na cerimônia de lançamento, estiveram presentes moradores das favelas e representantes de movimentos populares, organizações de direitos humanos, universidades, instituições de pesquisa e diversos mandatos parlamentares que estão se articulando nos últimos meses para a criação da comissão.
Entre eles, estava o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), representando a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Para Freixo, a criação da comissão popular é urgente, principalmente após o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL).
“Essa intervenção é uma farsa, é instrumento eleitoral. Não há qualquer planejamento, o que a torna ainda mais perigosa porque qualquer coisa pode ser feita nas periferias e favelas. Então é importante a gente estar pensando a Comissão Popular da Verdade. A gente tem uma dívida com a Marielle, não podemos recuar um milímetro. Estamos juntos para que a gente não perca mais Marielles, mas que possamos ter muitas outras Marielles nos espaços públicos, nas comissões e nos parlamentos, que ela continue viva através de nós”, afirmou Freixo.
Para Kátia Lopes, da Federação das Associações de Favelas do Rio (Faferj), a Comissão Popular também tem o papel de mostrar que os recursos gastos com a intervenção militar deveriam ser investidos em saúde, educação e moradia.
“Os impostos que pagamos estão sendo devolvidos para a gente em forma de violência. Essa Comissão é popular porque o poder vem do povo. Estamos juntos porque queremos a verdade dita pela população e não pela intervenção”, acrescentou.
Já Luana Carvalho, da coordenação estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), relembrou que a violação aos direitos humanos não é uma realidade exclusiva das cidades, mas também do campo.
“Em 2017 foram 70 execuções em conflitos por terra no campo. Por isso, a articulação entre campo e cidade é essencial para que a gente resista aos extermínios em nossos territórios que têm cor, gênero e classe social”, afirmou.
Próximas ações
Durante a cerimônia também foram apresentadas as próximas ações da Comissão Popular. Entre elas, está a construção de uma agenda de visitas às favelas e periferias para dialogar com entidades locais e moradores sobre a intervenção militar. A primeira reunião para organizar essa programação vai acontecer na próxima quarta-feira (25), a partir das 17h, na Caixa de Assistência dos Advogados do Rio de Janeiro (CAARJ), no centro do Rio.
Além disso, está em fase de articulação um encontro com parlamentares, membros da Comissão Popular e o interventor federal na Segurança Pública no estado do Rio de Janeiro, general do Exército Walter Souza Braga Netto, para denunciar, oficialmente, casos de violação aos direitos humanos que já foram apurados pela comissão.
Também se encontra em desenvolvimento um aplicativo para celular para coletar denúncias anônimas sobre a atuação do Exército no estado. Uma página no Facebook da Comissão Popular da Verdade será divulgada nos próximos dias. Outro canal de comunicação para denúncias anunciado é o telefone (21) 97145 6898, que já tem atendimento das 9h às 18h, todos os dias, e aceita chamadas a cobrar.
De acordo com Gizele Martins, moradora da Maré e membro da Comissão Popular da Verdade, uma das diretrizes da Comissão é dar luz ao que os moradores das favelas e áreas de conflito do estado do Rio tem a dizer sobre a intervenção.
“Nosso objetivo é mapear e denunciar a nível internacional o que a população pobre e negra sofre todos os dias. O genocídio dos mais pobres não pode ser colocado de lado e sozinhos. Nós, da favela, não conseguimos denunciar, por isso estamos juntos na criação dessa Comissão. Juntos somos mais fortes”, concluiu.
Criminalidade não diminuiu
Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), divulgados nesta semana, a intervenção militar não inibiu os índices de criminalidade. Os roubos de veículos, cargas, a pedestres, em ônibus e de celulares registraram seus piores índices da série histórica em março, primeiro mês completo do socorro dos militares.
Segundo o ISP, foi registrado um aumento de 7,1% nos roubos de veículos, que saltaram de 5.002, no mesmo mês do ano passado, para 5.358, resultando no pior março da série histórica, iniciada em 1991. É como se um automóvel fosse levado por assaltantes a cada oito minutos no estado. Houve recordes negativos também em crimes como roubos de cargas, a pedestres, em ônibus e de celulares.
Edição: Thalles Gomes