A vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada no último mês, teve carreira parlamentar curta, mas significativa. Em pouco mais de um ano, Marielle apresentou aproximadamente 20 projetos de lei na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, a maioria comprometida com as mulheres e os mais pobres. Uma das principais propostas do mandato de Marielle foi a criação do Espaço Coruja.
O projeto de lei tem como objetivo acolher crianças no horário noturno, entre 17h e 23h. A ideia é aproveitar espaços de educação infantil municipais já existentes para fazer o acolhimento e que o tempo conjugado de permanência da criança no Espaço Coruja, na creche ou escola seja de, no máximo, 10 horas por dia.
Para Nathalia Correa, de 26 anos, moradora de Irajá, o projeto é urgente. Nathalia é mãe de Arthur, de quatro anos, e estudante de pedagogia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Ela é mãe solo, ou seja, assume todas as responsabilidades pela criança, sejam financeiras ou por disponibilidade de tempo.
“Eu faço faculdade no horário noturno e não tenho uma solução fixa para meu filho. Tem dias que deixo com a minha mãe, mas nem sempre ela pode. Tem dias que eu deixo de estar na faculdade para estar com ele ou às vezes o levo comigo, mas isso pode ser um problema porque tem professores que não aceitam”, explica.
Na avaliação de Natália, o projeto pode beneficiar principalmente as mulheres, que ainda são as principais responsáveis pelos cuidados com os filhos e correm o risco de perderem seus empregos ou terem que largar seus estudos por não terem condições de contratar alguém para cuidar deles.
É o que comprova uma pesquisa do Ministério da Educação feita em 2016. Segundo levantamento, 18,1% das mulheres, entre 15 e 29 anos, indicaram a gravidez como motivo para largar os estudos. Já entre os homens da mesma faixa etária, somente 1,3% interrompem os estudos pela mesma razão.
Segundo Rafael Menezes, coordenador pedagógico CIEP Ministro Gustavo Capanema, que fica na Vila do Pinheiro, na Maré, o projeto é essencial nesse cenário, em que mães trabalhadoras não conseguem sequer se matricular nas escolas no turno da noite.
“Uma das grandes causas da evasão escolar das mães é o fato de não terem com quem deixar os filhos. Durante o dia temos as creches, mas quando chega a noite, que é o horário da mãe trabalhadora estudar, ela não tem com quem deixar as crianças”, explica.
Demanda do movimento feminista
De acordo com Iara Amora, que foi assessora do mandato de Marielle, o projeto surgiu justamente como uma demanda das mulheres. “Ele é fruto de uma discussão de muitos anos das mulheres e do movimento feminista. A creche é uma política pública super importante, mas no formato de hoje deixa de atender uma gama grande de mulheres. O projeto foi pensado para complementar e não substituir o serviço hoje oferecido pelo poder público”, acrescenta.
O projeto de lei Espaço Coruja está em tramitação na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, aguardando os pareceres das comissões especiais para que seja votado. Na página na internet destinada a ele, mais de 2260 pessoas assinaram um documento online para apoiar a iniciativa.
Edição: Vivian Virissimo