Eu falei pro Rogério que aquilo era uma cagada. Mas a gente estava empolgado. A campanha da associação de moradores ganhou força quando o pessoal queimou pneus na avenida. O nosso movimento repercutiu, ganhou apoio da comunidade. Em um momento muito difícil no país. Era enchente, falta de unidade de saúde, de segurança.
Foi quando, numa reunião, Rogério sugeriu que a gente levasse a nossa campanha pruma dessas rádios comerciais. Ele tinha um contato lá dentro. O Rogerião ficou empolgado, anunciou pra todo mundo que a matéria seria pra semana seguinte, bem no dia do nosso ato marcado.
Sugeriu até a gente passar pra rádio um pouco do caixa da associação.
Porém, no dia do ato, diante do caminhão de som, Rogério não quis conversa. Cabisbaixo, ele mostrou, no celular, a matéria da rádio. Nem ouvimos até o fim. A primeira frase do repórter já dizia “Luta gera lixo em avenida”, pisava em tudo que a gente sentia desde o começo daquela história. Dona Olga, nossa liderança mais velha, tentou consolar do seu jeito sincero:
“- Pois é. Às vezes a gente alimenta e até paga o leão que devora a gente”.
Edição: Júlia Rohden