Rio de Janeiro

CASO MARIELLE

"Jungmann não vai fazer política sobre o corpo da Marielle", afirma Freixo

"Fico honrado com a possibilidade da unidade da esquerda, mas para 2020", comentou

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |

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Freixo acredita que ter uma pauta em comum é essencial para a esquerda
Freixo acredita que ter uma pauta em comum é essencial para a esquerda - Jaqueline Deister

Em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL - RJ) falou sobre a gravidade do crime político contra a vereadora Marielle Franco, as medidas que estão sendo tomadas pelo partido com relação aos ataques de ódio nas redes sociais e a intervenção militar. O parlamentar também destacou a sua posição  sobre a construção de uma unidade da esquerda no Rio de Janeiro para disputar o governo do estado. 

Brasil de Fato: Como você vê essa grande adesão às manifestações que estão acontecendo não só no Brasil, mas pelo mundo inteiro, em solidariedade a esse triste caso ocorrido com a Marielle?

Marcelo Freixo: Assim como eu não esperava que fizessem isso com a Marielle, não havia nenhum indício disso, não tinha nenhuma ameaça, também não esperava essa reação tão forte e tão surpreendente do mundo inteiro. O que conforta de algum lado e não nos imobiliza, pelo contrário, acho que aumenta a necessidade da gente não sair da rua pra que tudo que a Marielle representou, e o mundo está reconhecendo isso, possa ter continuidade. Não tenho a menor ideia de quem fez isso com a Marielle, muito menos a motivação, mas seja lá o que for, tem que ter resposta e a resposta está sendo dada pelo mundo.

Ontem (dia 20) nós fizemos uma missa ecumênica de sétimo dia e teve um momento que a mãe da Mari se dirigiu à minha filha e falou: “não sabia que tanta gente assim amava minha filha”. Foi a fala da mãe da Marielle ontem à noite. Acho que isso resume muito bem o que a gente está falando. Tem muita gente chorando e sentindo profundamente a morte da Marielle sem a ter conhecido. Por quê? Gente do mundo inteiro chorando a morte dela, indignados. Talvez porque existisse uma Marielle dentro dessas pessoas, talvez porque existisse o significado da Marielle como um desejo tão profundo de mudança dentro de cada um. E as pessoas foram apresentadas à Marielle quando tentaram retirar essa Marielle de dentro das pessoas. Acho que isso de alguma maneira explica um pouco essa reação.

Toda a solidariedade mundial acaba sendo importante, mas por outro lado a gente vê também que estão ocorrendo muitas notícias falsas que estão sendo veiculadas principalmente nas redes sociais. Como que você vê esses ataques?

Isso é crime, não tem outro nome. Uma desembargadora, um deputado federal, quando falam determinadas coisas da Marielle eles cometem crime. Crime de calúnia, crime de difamação. Isso não é fake news, isso é crime, tem que ser tratado como crime. E tem que ser denunciado como crime. É isso que a gente está fazendo. Nesse momento, aqui do lado tem uma funcionária minha tratando só disso. Listando cada uma das coisas sobre a Marielle, sobre mim, sobre quem for e denunciando.

Nós entramos no Conselho Nacional de Justiça contra a desembargadora. Ela vai ter que responder criminalmente, penalmente por isso. Ela não é paga com dinheiro público pra pré-julgar. Ela é paga pra julgar. Então, se ela pré-julga alguma coisa baseada em racismo, baseado em preconceito de classe, que ela responda por isso. É inadmissível. A Marielle não vai sofrer um duplo homicídio. Mataram a Marielle de forma covarde. O duplo homicídio covarde a gente não vai aceitar.

Há  um movimento por parte da mídia, e também da Segurança Pública da atual gestão, de tentar utilizar o caso Marielle pra justamente provar a necessidade de se ter uma intervenção militar no Rio de Janeiro. Como você vê isso?

Olha, primeiro assim, a gente tem uma posição contrária à intervenção, sempre tivemos, Marielle, inclusive, publicamente se posicionou em relação à isso, num debate muito fácil de se fazer, muito tranquilo. Intervenção é uma jogada eleitoral do Temer. Pensada numa quarta-feira de cinzas pelo seu marqueteiro. Isso não é uma descoberta minha, eles dizem abertamente. Há uma frase, entre aspas, que diz: “é uma grande jogada de mestre”. Uma entrevista do seu marqueteiro dizendo que programou isso na quarta-feira de cinzas depois de um politizado carnaval no Rio de Janeiro.

A gente completa um mês da intervenção e nada aconteceu, os índices de homicídios, assaltos e roubos de carga aumentaram por uma razão muito simples: não tem planejamento. Isso não foi pensado numa lógica de segurança pública. A integração era bem vinda, a intervenção não. Se o Exército, Polícia Federal quisessem contribuir com a Segurança Pública desde que nós tivéssemos governo, porque é um problema, nós não temos governo no Rio de Janeiro. Essa integração seria bem vinda no setor de inteligência, na ação preventiva, no controle do comércio de armas e munições, tem varias propostas. Eu defendo a integração no relatório da CPI, mas não a intervenção, que é uma jogada de marketing para salvar o PMDB, não o Rio de Janeiro.

Eu quero pontuar especificamente a fala do Ministro Jugmann, que foi uma das coisas mais desrespeitosas que eu vi nos últimos tempos. O Jugmann não vai conseguir fazer política sobre o corpo da Marielle. Isso a gente repudia veementemente. É inadmissível o que ele vem fazendo. Uma coisa é a divergência política. Agora, usar a  Marielle para isso é intolerável. Ele não pode dar uma entrevista dizendo que a morte da Marielle é a prova de que a  intervenção era necessária. Ele não respeita a dor da perda,  ele quer fazer política sobre um corpo. E sobre o corpo de uma mulher negra que ele não tem o direito de se referir a ela dessa maneira.

Na coluna do Paulo Cappelli do jornal O DIA de hoje (21) foi noticiado que o PT e o PC do B abririam mão de suas candidaturas se você concorresse ao governo estadual. Essa possibilidade existe? Como que você vê essa movimentação?

Eu fui surpreendido com essa notícia porque eu encontrei com todos os companheiros do PT e PC do B ao longo da semana inteira e ninguém me falou absolutamente nada. Ninguém me chamou para nenhuma reunião, ninguém me falou nada, eu fiquei sabendo através da imprensa.

Até acho estranho saber disso a partir de uma nota e não de uma conversa, porque são pessoas por quem eu tenho muito carinho e respeito. Mas fico muito honrado de saber que  existe a possibilidade da unidade da esquerda. Acho que para 2020 seria ótimo e já abro a possibilidade deste diálogo, sem dúvida.

Acho que para agora nós já temos uma candidatura e eu quero tratar do caso da Marielle, acho que não é hora de por nota de jornal fazer esse tipo de colação, mas temos uma candidatura colocada que está debatendo o programa amplamente. Acho que a unidade da esquerda é muito importante sempre. Acho que hoje a unidade nos temas é viável e necessária. A unidade eleitoral é uma construção, é programa, conversa.

E como que você vê a importância de uma unidade da esquerda, como você bem mencionou, aqui dentro do estado do Rio?

Reflete uma mudança muito grande das pessoas não acharem que com o PMDB se faz política. Teve um setor da esquerda que acreditou que era com o Eduardo Paes, Picciani e Cabral que poderíamos ter avanço na cidade e a gente sempre achou que não. Se a gente supera isso e entende que o PMDB não é um aliado em nenhuma hipótese, isso fará bem para a esquerda. E precisamos estar juntos nos temas, ter uma pauta em comum, independente de termos uma aliança eleitoral. 

Edição: Raquel Júnia