Com objetivo de acompanhar de perto e denunciar as violações aos direitos humanos cometidas pelo Exército durante a intervenção militar no Rio de Janeiro, está sendo articulada a criação da Comissão Popular da Verdade. Seu nome faz referência à Comissão Nacional da Verdade, criada em 2011 para apurar violações ocorridas na ditadura militar.
A Comissão Popular tem sido construída por moradores das favelas, movimentos populares, organizações de direitos humanos, universidades, instituições de pesquisa e diversos mandatos parlamentares. Shirley Muriel, moradora da Rocinha e membro do Coletivo de Favelas, participa da construção da Comissão. Para ela, esse é um espaço muito importante para que os mais pobres consigam sobreviver e resistir à intervenção militar no dia a dia.
“Antes a gente conseguia denunciar nos ministérios e na Defensoria Pública, mas a gente não tinha uma organização com pessoas de outras favelas. Então, a comissão vem com o propósito de unir forças de várias organizações para trabalhar pela segurança do povo”, explica.
Uma das maiores preocupações de Shirley com a intervenção é o aumento da perseguição e restrição de liberdades aos moradores das favelas.
“Cada dia estamos com mais medo. A Rocinha está passando por um processo de violência, já tivemos outras intervenções lá com o Exército e só piora a violência. Quando fazemos manifestação no outro dia vem bomba, vem tiro, vem todo o processo de repressão do estado em cima da gente. Estamos sendo controlados, estamos com medo. A morte da Marielle nos deixou com mais medo ainda”, desabafa.
A Comissão Popular da Verdade se reúne justamente a partir da necessidade de construir um espaço de denúncia que não precise esperar o fim da intervenção militar para começar a atuar, segundo Fernanda Pradal, professora de Direito da PUC-Rio e pesquisadora do Núcleo de Direitos Humanos.
“Uma Comissão Popular da Verdade do tempo presente pode fazer frente ao aprofundamento da situação de violações sistemáticas de direitos pelas forças de segurança, ao afirmar que não haverá silenciamento e imposição de esquecimento sobre essas ações”, explica.
A Comissão Popular foi pensada em resposta à declaração do general Eduardo Villas Bôas, que reivindicou “garantia aos militares para agir sem o risco de surgir uma nova Comissão da Verdade no futuro”, como aconteceu 30 anos depois do fim da ditadura militar. Sua organização se mostrou ainda mais urgente depois do assassinato da vereadora Marielle Franco. do PSOL.
Segundo Lucas Pedretti, militante do Coletivo Memória, Verdade e Justiça do Rio de Janeiro, o grupo tem se organizado na tentativa de criar uma unidade entre as frentes que estão agindo para denunciar as ameaças aos direitos humanos no contexto de intervenção militar.
“A morte da Marielle foi um acontecimento brutal e trágico, que pegou todo mundo de surpresa e, sem dúvida, muda muito a conjuntura. Estamos vendo um momento de radicalização da violência. Uma das coisas que temos clareza é que se torna fundamental unificar as iniciativas, precisamos nos fortalecer ainda mais”, afirma.
Edição: Vivian Virissimo