No sábado (17) as famílias do acampamento Helenira Rezende, instaladas às margens da BR -155, no Km 52, entre Marabá e Eldorado do Carajás, na região sudeste do Pará, passaram mal depois que um avião pulverizador jogou veneno nas proximidades do acampamento.
Segundo denúncias o avião sobrevoou o acampamento por volta do meio-dia. Edileusa Souza Gomes, 47 anos, agricultora, conta que logo depois que o avião jogou o agrotóxico muitas pessoas começaram a passar mal.
“Tinha duas moças lá com a gente e uma senhora, elas começaram a passar mal, no começo a gente até brincou que elas estavam de brincadeira, que ainda não tinha dado tempo, mas depois veio mais gente passando mal, teve um irmão que desmaiou, as crianças também começaram a ficar ruim”, recorda.
Edileuza tem dois netinhos, um deles é diabético e não apresentou problemas porque foi retirado de casa a tempo, mas o outro neto passou a noite com mal-estar. A família toda moram no local há oito anos.
Vivem no acampamento cerca de 350 famílias, antes do despejo, determinado pela justiça do Pará, em novembro do ano passado, elas ocupavam uma área de, aproximadamente, 10 mil hectares espalhados em lotes e vilas pelas fazendas Cedro e Fortaleza e que integram um conjunto de fazendas chamado Complexo Cedro. A empresa Agro Santa Bárbara Xinguara S/A (AgroSB) alega ser dona da área.
Terra pública
Depois da pulverização as famílias se sentiram ameaçadas e voltaram a ocupar a área da Fazenda Cedro. A liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Wildianei Gomes, da direção estadual recorda que durante a audiência de despejo das famílias em novembro de 2017 foi verificado que uma das áreas dentro do complexo é terra da União e não da AgroSB.
“No momento dos despejos a gente conseguiu comprovar em audiência que uma dessas áreas, que seria a [fazenda] Fortaleza, onde estamos, é uma área pública, aliás desde o primeiro dia da ocupação a gente faz a denúncia ao Incra sobre a existência de terras públicas nesse complexo, que sempre foi muito ignorado”, relata.
De acordo com o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PA), José Brito Neto, uma comitiva composta por representantes Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) e a Sociedade Paraense de Direitos Humanos (SDDH) estiveram no acampamento na segunda-feira (19).
Durante a visita eles conseguiram chegar até uma pista de pouso que fica dentro do Complexo Cedro e lá encontraram vários pesticidas da marca Zapp QI 620, cujo composição é o Glifosato Potássico, o agrotóxico com maior volume de vendas no Brasil.
Veneno
Em 2015 a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC, sigla em inglês) havia concluído que o produto poderia causar câncer. Devido a divergências entre diversos órgãos de pesquisa, o pesticida está em reavaliação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a previsão é que a análise toxicológica seja concluída só em 2019.
O presidente informou que leu uma das bulas do produto e a orientação dizia que a área deveria ter sido isolada por 24 horas e relata indignado o que viu: “Então é um absurdo sabe, tem gente doente, com queimaduras no rosto, tem criança com vômito, gente com insônia”.
A reportagem do Brasil de Fato não conseguiu falar com a assessoria de comunicação a AgroSB para verificar se o avião era de propriedade da empresa. Foi enviado um e-mail, mas até o fim da edição desta reportagem não houve retorno. O Brasil de Fato ainda tentou ligar para um contato informado no site, mas ninguém atendeu.
O Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra) afirmou que foi notificada sobre o ocorrido e aguarda conclusão do relatório da Delegacia de Conflitos Agrários (Deca) de Marabá.
A comitiva apresentou um relatório e segundo o documento “mesmo quase 40 horas depois do ataque, era possível sentir o cheiro do veneno”. A delegação emitiu oficio para a Secretaria Municipal, de Saúde, Assistência Social e Ministério Público do estado para que possam verificar o atendimento médico às famílias. Assim que a comitiva chegar em Belém também será encaminhar oficio à Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Segup).
Edição: Juca Guimarães