Decreto presidencial pode aprofundar violação dos direitos humanos dentro de presídios, aponta professor de direito
Nas últimas semanas, o tema da segurança pública está na boca do povo. Muito tem se falado e criticado, em especial, sobre o decreto legislativo de intervenção federal no estado do Rio de Janeiro (PDC 88/18).
Colocada em pauta pelo governo golpista de Michel Temer (MDB) e aprovada na Câmara dos Deputados e no Senado por uma maioria de votos dos parlamentares, a matéria transfere a segurança pública fluminense da esfera estadual para a federal, sob o comando do corpo militar. O General do Exército Walter Braga Netto, que é responsável pelo Comando Militar do Leste (CML), foi nomeado para o cargo de interventor e assume o controle da missão.
Uma das atribuições conferidas às Forças Armadas diz respeito aos presídios do Rio. No entanto, a realidade desse espaço é alarmante no estado. De acordo com levantamento da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, dos 45 presídios existentes, 33 operam acima de sua capacidade. A superlotação é expressiva: são 51.511 presos para 28.688 mil vagas.
Pelas ruas de São Paulo, este foi o tema do quadro Fala aí. O estudante de economia Chico Gremaud, de 20 anos, questionou quais serão as possíveis consequências dessa medida para os presos fluminenses.
"Oi, meu nome é Chico, tenho 20 anos e sou estudante de economia. Minha dúvida é sobre a intervenção militar no Rio de Janeiro. Queria saber quais são as implicações, o que pode acontecer com os presos sob o comando dos militares no sistema carcerário?"
Para responder, o Brasil de Fato conversou com Taiguara Souza, advogado e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e membro do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro entre os anos de 2011 e 2015. Confira a explicação do professor:
"A intervenção federal no Rio de Janeiro está restrita à esfera da segurança pública. A gente realmente fica preocupado porque todos os órgãos de segurança pública do estado ficariam sob atribuição do interventor, um cargo, inclusive, de natureza militar — polícia civil, militar, corpo de bombeiros e, também, as agências penitenciárias. Fica a grande preocupação sobre quais são os impactos que podem advir daí.
Temos uma realidade prisional do Rio de Janeiro muito grave, um índice de superlotação da ordem de quase 50%; a população prisional está próxima de 60 mil presos e possui graves problemas de doenças respiratórias e de pele, como, por exemplo, epidemia de tuberculose. Além de problemas graves de fornecimento e abastecimento de água das unidades prisionais, alimentação extremamente precária e um índice de violência institucional muito elevado nessas instituições.
Fica a dúvida em relação a como essa gestão, de natureza militar, vai lidar com essas questões. Ao que parece, já há uma orientação de maior severidade na gestão penitenciária, maior restrição à visita de familiares dos presos. Questionamos se esse verdadeiro barril de pólvora que é o sistema penitenciário, não só no Rio de Janeiro mas em todo o país, não irá explodir no estado.
Há muitos anos, não percebíamos rebeliões abertamente declaradas e nós já tivemos, há poucos dias, uma primeira, coincidindo quase que com o decreto de intervenção federal. Há um ambiente de instabilidade, de grande temor sobre quais seriam as consequências da intervenção federal. Ficam os nossos votos de que sejam respeitados os direitos fundamentais dos presos e de seus familiares. Há que se ter muita atenção com essa intervenção federal, porque pode representar sim uma violação muito grave dos direitos e garantias nesse espaço da jurisdição tão sensível que é o cárcere."
Edição: Anelize Moreira