As 900 famílias da ocupação que tornou-se um símbolo do problema habitacional de Londrina, segunda maior cidade do Paraná, permanecem resistindo no local que antes abrigava um canteiro de obras de habitações populares abandonado.
A ordem de despejo dos moradores da comunidade Flores do Campo seria executada no dia 21, mas foi suspensa no dia 20 pelo desembargador Luís Alberto de Azevedo Aurvalle, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. O recurso foi ajuizado pela Defensoria Pública da União, em nome das famílias que ocupam a área há 13 meses.
O despejo das famílias, com auxílio da força policial, havia sido determinado no dia 16 de novembro, pela juíza Georgia Zimmerman, da 1ª Vara Federal de Londrina. Com a decisão do Tribunal Regional Federal, os moradores tem até 90 dias para desocupar o local.
O despejo das famílias com auxílio da força policial havia sido determinado no último dia 16 de novembro , pela juíza Georgia Zimmerman, da 1ª Vara Federal de Londrina. Com a decisão do Tribunal Regional Federal, os moradores tem até 90 dias para desocupar o local.
Antes de ser ocupado, no dia 1º de outubro de 2016, o local era um canteiro de obras parado há cerca de seis meses. Ali seriam construídas 1.218 unidades habitacionais do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), do Governo Federal. Porém, a construtora responsável pelo empreendimento descumpriu o contrato com a Caixa Econômica Federal e havia paralisado a obra no início de 2016. Segundo a Caixa, apenas 48% da obra está concluída.
Apesar da propriedade do terreno não ser, de fato, das famílias ocupantes, a contestação da Defensoria Pública da União (DPU) chamou atenção para o fato de que muitas das famílias se encontram no denominado “público alvo” do Programa Minha Casa Minha Vida e, por isso, “a sua manutenção no imóvel melhor atende à função social da propriedade”, diz o documento.
Descaso
Segundo a advogada popular da organização de direitos humanos Terra de Direitos, Maria Eugenia Trombini, a determinação de desocupação não previa a realocação das famílias, de idosos e criança. “As cerca de 4 mil pessoas não tinham para onde ir caso a ordem de reintegração de posse fosse cumprida”, explica. Ela conta que os moradores tentaram buscar soluções com a Caixa Econômica Federal e com a prefeitura de Londrina, mas não foram atendidos. “Esperamos que dentro do prazo de suspensão as autoridades se disponham a dialogar”.
Procurada pelo Brasil de Fato, a assessoria de imprensa da Prefeitura de Londrina informou que não se manifestaria sobre o caso, já que a ação foi movida pela Caixa. A falta de posicionamento do prefeito Marcelo Belinatti gerou descontentamento entre os moradores da ocupação. Em 2016, enquanto candidato à prefeitura, ele chegou a visitar o local e declarar apoio às famílias. “Se ele tá achando que vai vir aqui fazer promessa pra nós e depois vai apoiar o povo a jogar nós na rua com uma mão na frente e outra atrás, ele está muito enganado”, se indigna Marília, moradora da ocupação. “Mas não vai ficar assim, assim que expulsarem a gente daqui nós vamos procurar um desses lugares e vamos ocupar, mas na rua nós não vamos ficar”.
Os moradores do local seguem cobrando alternativas para o problema habitacional da cidade. "Nós somos do bem. Por favor, nós queremos casa para morar. Eu já coloquei tudo dentro da minha. Nós não queremos guerra, nós queremos solução para os problemas, escola para as crianças. Deus está vendo o que vocês estão fazendo", suplicou a moradora Maria Helena de Souza.
Sem ter para onde ir
Segundo Nilson Antunes da Silva, delegado da polícia federal responsável por cumprir a reintegração de posse, as famílias que não tivessem um lugar para ir seriam encaminhadas para abrigos provisórios do município, onde poderiam permanecer por até três dias. A ação seria acompanhada pela Polícia Militar e pela Guarda Municipal, além de representantes da Secretaria de Educação e da Assistência Social do município. Apesar de não divulgar a quantidade de policiais que seriam deslocados para a ação, o delegado declarou que o número seria suficiente para o cumprimento da ordem.
A Caixa Federal também disponibilizou cerca de 30 caminhões para o transporte de pertences dos moradores, que seriam encaminhados para os locais indicados por cada pessoa. As famílias que estivessem inscritas em programas habitacionais estariam na fila para serem contempladas. Mas essa não é a realidade da maior parte das pessoas.
Apesar de Marília ter baixa renda, ela não se enquadra nos critérios da COHAB por não ter rendimento comprovado e fixo. A mulher trabalha como diarista."Ninguém mora numa ocupação porque gosta, e sim por que precisa. Ninguém aqui tem para onde ir, porque se tivesse, não estaria aqui", fala.
Apesar de a Companhia de Habitação Popular do Paraná ter participado com subsídios financeiros para o desenvolvimento do conjunto habitacional, a Cohapar declarou, através da assessoria de imprensa, não ter responsabilidade com a área e com as famílias que ocupam o local. A companhia forneceu um um aporte financeiro de R$ 3 mil e parceria entre Copel e Sanepar para reduzir os custos de financiamento.
Responsável pela obra e pela ação de reintegração de posse, a Caixa Econômica Federal optou por não se posicionar sobre o caso.
Edição: Ednubia Ghisi