Apesar da forte campanha pela abstenção realizada pelos partidos de oposição na Venezuela, desde as primeiras horas da manhã deste domingo (30), os eleitores e eleitoras compareceram massivamente aos centros de votação. Em Caracas, a cidade permaneceu dividia em duas: do lado oeste, sessões eleitorais abarrotadas pelo povo; do lado leste, onde se concentram as manifestações opositoras ao governo de Nicolás Maduro que já duram mais de três meses, as ruas estiveram vazias até o começo da tarde.
A concentração opositora na praça França de Altamira só começou pouco depois do meio dia, embora estivessem proibidas segundo a lei venezuelana que, assim como a brasileira, proíbe manifestações políticas durante a jornada eleitoral.
Pelas redes sociais, viralizou um vídeo de um ataque terrorista a bomba perpetrado pelos grupos de oposição contra um comboio da Guarda Nacional Bolivariana, deixando sete oficiais feridos com queimaduras de segundo e terceiro graus, e outros cinco civis com ferimentos leves.
Assim mesmo, ao redor do mundo, foi criada uma matriz de opinião, pelos meios de comunicação comerciais, que buscou transformar os protestos pontuais em caos generalizado, como uma forma de deslegitimar o processo constituinte na Venezuela.
O El País, da Espanha, titulou: “Violência e abstenção durante a votação da Constituinte de Maduro”. No momento em que foi publicada, o Conselho Nacional Eleitoral sequer havia divulgado o primeiro balanço sobre a participação na jornada.
A capa do argentino Clarín estampou uma foto do ataque terrorista opositor, com o título “Caracas, entre gases, repressão e parapolícias”, referindo-se à Guarda Nacional Bolivariana.
O New York Times disse: “Violência marca a eleição da Assembleia Constituinte na Venezuela”. O jornal estadunidense menciona a explosão ocorrida ‘em uma das principais ruas de Caracas’, mas não revela os causadores.
O site da Folha de São Paulo titulou: “Tomada por barricadas, Caracas tem votação com poucas filas”. O jornal parecera ter coberto somente dois ou três bairros da capital, desconsiderando as enormes filas que se formaram ao redor de diversos centros de votação diversas outras regiões de Caracas e do país, e falando de uma ‘toma’ que, convocada pela oposição sob o mesmo nome, jamais foi realizada.
A agência de notícias EFE publicou em uma rede social: “Um agente ferido pela explosão de três motos da polícia de Caracas durante as eleições da Constituinte venezuelana”, ignorando que a explosão havia sido causada pela bomba plantada pelos grupos de oposição.
Todas as manchetes caminhavam na mesma direção: a criação de uma matriz de opinião articulada pela imprensa internacional, que revela uma intencionalidade política com o objetivo de instigar internamente aos setores opositores a seguir resistindo ao processo democrático popular e, externamente, incentivar uma intervenção estrangeira em um país soberano.
“Nenhum governo do mundo tem o direito de não reconhecer a vontade, a soberania popular. Este povo existe, tem alma, tem consciência. E eles têm que respeitá-lo”, destacou o ex-vice-presidente da República e coordenador da comissão presidencial constituinte, Elías Jaua, frente à estratégia midiático-política internacional.
Poliedro de Caracas: onde votou o povo do leste
A imprensa internacional ficou apenas com a imagem gerada pelos grupos opositores em regiões específicas da capital e em outras poucas cidades do país. Seguramente não tiveram tempo de conferir as longas filas geradas nas aforas do Poliedro de Caracas (maior centro de votação, habilitado para receber os eleitores das zonas de protestos). Mas a análise da imagem deve levar em conta um elemento: os eleitores que compareceram ao ginásio, localizado na região sudeste da cidade, eram precisamente os moradores do leste da capital, que não puderam votar em suas respectivas seções eleitorais, impedidos pelos grupos violentos da oposição.
A votação no Poliedro foi uma novidade no processo eleitoral da Venezuela. Tratou-se de uma resposta do Conselho Nacional Eleitoral às ameaças e chamados à violência dos grupos opositores, ativando um plano de contingência para permitir que os eleitores das zonas de conflito pudessem exercer seu direito ao voto.
Brasil assume a política externa da hipocrisia
Alinhado com os governos mais à direita e tão impopulares quanto ele, o governo brasileiro arremeteu contra a soberania da Venezuela durante a realização da eleição pela Assembleia Nacional Constituinte (ANC). Citando uma coluna no jornal Folha de São Paulo, o diário venezuelano El Universal reproduziu falas do chanceler do governo de Michel Temer, Aloysio Nunes, segundo as quais afirma que a ANC se tratava de uma ‘manobra’ do governo de Nicolás Maduro. Justo ele, chanceler de um governo sem votos, produto de uma manobra política golpista.
Aloysio Nunes se disse ‘indignado’ com a repressão aos manifestantes venezuelanos e defendeu a ‘reconstrução da Venezuela’. O ministro brasileiro, que em outro momento já defendeu a renúncia do presidente Nicolás Maduro e a realização de eleições diretas, parece recomendar à Venezuela as mesmas saídas que defendem os movimentos populares do Brasil para a grave crise que o país enfrenta, desde que a direita brasileira resolveu adotar métodos antidemocráticos e retirar da presidência uma presidenta democraticamente eleita, colocando no poder um governo que hoje em dia goza de menos de 5% de popularidade.
Forças Armadas Bolivarianas: “Respeitem a vontade popular”
Logo depois do fim da votação, o ministro da Defesa da Venezuela, Vladmir Padrino Lopez, realizou uma coletiva de imprensa, na qual destacou a alta participação popular na votação pela Constituinte e o sucesso do Plano República, operação de segurança destacada para o controle da ordem pública durante os últimos 25 processos eleitorais da Venezuela.
“Foi colocado em jogo a soberania da pátria. E quando isso acontece, encontrarão uma Forças Armadas de pé”, afirmou. “Sabemos o caminho que queremos transitar, e é o caminho de Bolívar, da independência, do direito de sermos livres”.
Lopez confirmou a morte de um oficial da Guarda Nacional Bolivariana dentro de um centro de votação na cidade andina de Mérida, no oeste do país. Referindo-se aos chamados de insurreição feitos pela oposição, ele disse: “Deixem de fazer chamados às Forças Armadas. Temos suficiente consciência do papel que as Forças Armadas têm nesses 18 anos”.
E também enviou uma mensagem aos países que insistem em intervir nos assuntos internos da Venezuela: “Peço aos países de todo mundo: respeitem a vontade popular”.
Edição: Simone Freire