Mesmo recebendo um dos maiores investimentos do orçamento do município do Rio de Janeiro nos últimos anos, a saúde pública enfrenta problemas sérios em suas unidades de atendimento. Entre os mais relatados por usuários e servidores está a superlotação dos ambulatórios, a carência de especialidades médicas e as enormes filas de espera para atendimento.
O Brasil de Fato teve acesso a dados exclusivos que mostram que há aproximadamente 11 mil pessoas a espera de uma consulta oftalmológica na cidade, sendo que o último paciente da fila aguarda atendimento desde maio de 2015. Outras especialidades como urologia, neurologia e cirurgia pediátrica também têm filas de espera semelhantes.
Por esses motivos a saúde pública foi apontada por 46% dos cariocas como o principal problema da cidade, de acordo com pesquisa Datafolha, produzida antes do primeiro turno das eleições municipais. E todas essas problemáticas estão diretamente relacionadas ao modelo de gestão por meio das organizações sociais (OSs), introduzido por Eduardo Paes (PMDB) e principal proposta de governo do candidato Marcelo Crivella (PRB). Hoje, dez OSs administram 108 das 248 unidades de saúde da prefeitura do Rio.
“Crivella representa uma piora ainda maior do que Paes na saúde. Além de fortalecer as OSs ele quer expandir a gestão privada para as unidades que são geridas pela prefeitura através de metas. Isso pode ter consequências como atendimento mais rápido e menos eficiente. Quer dizer atender mais pessoas, mas não com qualidade”, explica a servidora municipal da área da saúde, Ana Carolina Souza.
As OSs são instituições de direito privado sem fins lucrativos, que firmam parcerias com o estado, podendo gerir ensino, pesquisa, tecnologia, meio ambiente, cultura e saúde. Para dar mais agilidade à administração pública, a OS pode ser escolhida sem licitação para gerir serviços públicos por meio de contratos de gestão assinados com o poder público. No Rio, oito das dez OSs que atuam na saúde são investigadas no Ministério Público (MP) estadual e no Tribunal de Justiça (TJ) do Rio por suspeitas de irregularidades.
Nos últimos cinco anos, o orçamento destinado pelo município às OS aumentou à medida que novas parcerias surgiram. No orçamento de R$ 4,9 bilhões da saúde para 2016, aprovado pela Câmara dos Vereadores, as organizações sociais têm R$ 1,9 bilhão. O valor é maior do que a maioria dos orçamentos previstos para os 32 órgãos da prefeitura.
De acordo com a servidora Ana Carolina Souza, além dos escândalos de corrupção que envolvem as OSs no Rio, o modelo de gestão apresenta vários problemas para usuários e servidores. O primeiro deles é o alto índice de desistência de profissionais gerado pela fragilidade do vínculo empregatício, por isso a carência de médicos em algumas especialidades e as grandes filas de espera. Outra questão é o plano de metas estabelecido pelas OSs, que faz com que os atendimentos sejam mais rápidos e piorem a qualidade.
Além de propor fortalecer a gestão das OSs, Crivella (PRB) quer estabelecer um novo plano de cargos e salários baseado na meritocracia para todos os servidores da saúde do município. Enquanto o candidato Marcelo Freixo (Psol) propõe reforçar a gestão pública, ao realizar concursos públicos para recompor o quadro de servidores e criar um plano de carreira para melhorar os salários e as condições de trabalho dos profissionais da saúde.
Outra proposta de Freixo (Psol) visa democratizar a gestão das políticas públicas de saúde, incentivando a criação de conselhos gestores em cada unidade. Hoje, existem Conselhos Municipais, que reúnem trabalhadores, gestores e usuários, porém estão esvaziados. “A ideia do Freixo é entender as demandas locais para que a secretaria de saúde possa trabalhar em conjunto com a população”, acrescenta Ana Carolina.
Para a moradora de Manguinhos, Shirley Cândido, 28 anos, essa é a melhor proposta para a cidade. “O morador sabe o que é preciso, então, quando ele é ouvido a tendência é que as coisas melhorem. A gente mora na comunidade, somos muito discriminados, quando o poder público nos dá atenção as coisas melhoram. O importante não é o que eles querem implantar e sim o que a gente precisa. E nós sabemos do que precisamos”, afirma.
Edição: Vivian Virissimo
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