No sexto mandato como deputada federal pelo Rio de Janeiro, a médica Jandira Feghali é também candidata à Prefeitura do Rio nestas eleições. Líder do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) na Câmara, deu início à carreira política em 1981, quando o partido ainda estava na clandestinidade, quatro anos antes do fim da ditadura militar. Nascida em Curitiba, no Paraná, Jandira fez carreira política no Rio, tendo participado da luta pela Anistia e da campanha das “Diretas Já!”. Em entrevista ao Brasil de Fato, falou da necessidade de inverter prioridades na gestão da Prefeitura, que hoje é tomada pelos interesses dos empresários.
Brasil de Fato - Qual será o maior desafio ao assumir a Prefeitura do Rio de Janeiro, que mostra indícios claros de ter quebrado após oito anos de governo PMDB?
Jandira Feghali - Precisamos fazer uma profunda auditoria nas contas da Prefeitura, até para ter a real noção do cenário. A lógica é inverter as prioridades de gestão, hoje tomada de interesses pelos empresários, principalmente os de ônibus. Para gerar divisas, vamos desenvolver e integrar todos os territórios com suas particularidades, estimulando a geração de oportunidades e diferentes economias de nossa cidade, como cultura e entretenimento, turismo, negócios e indústria.
Brasil de Fato - Como o golpe de estado interfere nas eleições e na política municipal?
Totalmente. Hoje você tem um governo ilegítimo que põe no forno um pacote de fim de direitos e cortes em áreas fundamentais, como saúde e educação. E as cidades dependem, sim, de recursos federais. Então é mais do que necessário que Temer saia até o fim do ano e haja novas eleições para presidente.
Brasil de Fato - Quais são os legados deixados pelos Jogos Olímpicos à cidade na sua opinião?
Legado que não existe, na prática. Muito se gastou na cidade, mas a Prefeitura geriu muito mal esses recursos. Bilhões vieram dos governos Lula e Dilma, mas a gestão atual pouco fez. A mobilidade continua péssima, o saneamento idem e a cidade consumindo uma ilusão. Sobre os equipamentos olímpicos, é preciso reintegrar o povo a eles, com fomento a novos atletas e profissionais, com as escolas participando ativamente destes espaços, também com estímulo à cultura e outros grandes eventos esportivos.
Brasil de Fato - E quanto à saúde pública, que foi apontada por 46% dos cariocas, em pesquisa produzida pelo Datafolha, como o principal problema enfrentado na cidade?
Sem gestão ou visão da realidade. Hoje o Sistema Nacional de Regulação é péssimo no gerenciamento da marcação de consultas da cidade. Marca numa rua, mas na rua vizinha não. Ou seja, falta integração com todas as unidades médicas. Tem paciente que fica rodando a cidade atrás de uma consulta, sendo que tudo deveria começar no bairro dele. Queremos completar as equipes de profissionais de saúde, criar o horário noturno na Atenção Básica e atuar na prevenção de endemias e no controle de doenças crônicas.
Brasil de Fato - Como avalia as verbas destinadas pela Prefeitura do Rio à educação?
A Prefeitura não investiu o necessário exigido. A luta para uma cidade que consiga ter investimentos adequados passa também pela luta democrática, visto que o Governo Federal tenta impor uma agenda que impacta todas as cidades. O Legislativo local tem a missão de gerar também saídas para a cidade. É importante o diálogo e a participação da sociedade para romper essas barreiras.
Brasil de Fato - Entre 2009 e 2015, mais de 77 mil pessoas foram removidas de suas casas pela Prefeitura do Rio. O que tem a dizer sobre a questão da moradia no Rio?
Hoje você tem um déficit de mais de 200 mil moradias na cidade, o que é um absurdo. O cara mora num barraco de papelão e aquilo não pode ser considerado uma moradia. O Governo Temer, para variar, aponta para redução de investimento no Minha Casa, Minha Vida, que é uma política eficiente de redução desse déficit. Isso mostra que não há compromisso com as camadas mais pobres da cidade. Sobre as remoções, a Prefeitura seguiu a vontade das empresas, sem consultar a população. É inadmissível que intervenções dessas aconteçam sem apoio da comunidade, do território.
Brasil de Fato - Sobre a segurança pública, uma constante preocupação dos cariocas, como pode ser tratada sem que aumente a repressão nas favelas e periferias?
Fazendo com que a Prefeitura atue de forma direta nas decisões que Estado e Governo Federal tomam, como uma política de segurança integrada. Hoje, morrem, dentro das favelas, principalmente negros e jovens, com chacinas diárias clandestinas. O poder público municipal tem o dever de mudar esse ambiente, mudar a cultura do território violento. Em vez de mandar uma bala, mande um teatro, uma escola, uma biblioteca. Canso de ver mães me dizendo que não querem o filho na rua, mas desejam uma escola em tempo integral, com área de lazer local. Essa requalificação dos territórios precisa ser feita para começar uma mudança real na vida das pessoas, principalmente dos mais jovens.
Brasil de Fato - No Rio, não temos um sistema de transporte que atenda a todas as regiões. Como enxerga o papel da Prefeitura para melhorar a mobilidade urbana?
Como papel central. A saída é dar integração aos diferentes modais, que hoje não existe. O BRT deve ser mantido, mas sozinho fica saturado. Aliás, ele nasce já saturado na Zona Oeste. É preciso investir em trilhos e não em rodas. A prioridade também é importante. O investimento dado para a linha 4 do metrô poderia ter sido usado para ligar outras áreas do Rio, como Santa Cruz. É importante também desenvolver o Passe Livre Social, dando gratuidade aos estudantes da rede pública, cotistas, universitários do Prouni e FIES, cadastrados do bolsa-família e desempregados.
Brasil de Fato - Se eleita, o que pretende fazer com o Canal da Cidadania que o prefeito Eduardo Paes reprimiu em sua gestão?
Parece que há um preconceito por parte da atual gestão em instrumentos que garantam a democratização da informação. Se alinharam à grande mídia e de lá não sairão. Vamos implementar, com a participação dos diferentes segmentos da sociedade, mídia comunitária e midialivristas. Garantir a pluralidade de informação é dar ao morador acesso às diferentes linguagens e narrativas.
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