Cerca de 800 famílias que vivem na Cidade Industrial de Curitiba (CIC), região sudoeste da capital, podem ser despejadas de uma ocupação urbana a qualquer momento. A ameaça tem origem na disputa sobre o terreno em que as famílias, organizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto do Paraná (MTST PR), vivem desde abril de 2015. O local possui 145,2 mil metros quadrados e é reivindicado tanto por quem busca habitação, quanto pela empresa Essencis Soluções Ambientais, que visa ampliar seus negócios.
A ação reivindicatória de posse, que pressiona o despejo pela Polícia Militar (PM), foi emitida pela massa falida da empresa Stirps Empreendimentos e Participações Ltda., que subloca o terreno ocupado pelas famílias para a Essencis, e está sendo julgada pela 2ª. Vara de Falências e Recuperações Judiciais.
De acordo com informações da Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo de Curitiba, o Ministério Público buscou mediar o diálogo entre as partes envolvidas para encontrar uma forma pacífica de desocupar a área, assim como solicita à Juíza responsável pelo caso um prazo até que as famílias sejam realocadas. Contudo, nesta quarta-feira (25), a massa falida emitiu uma ação pedindo a execução da ordem de despejo e a punição do comando da PM por meio de multas, em caso de descumprimento.
A integrante do MTST PR, Sylvia Malatesta, confirma a tentativa de diálogo com o poder público. Segundo ela, reuniões com a Secretaria Especial de Assuntos Fundiários, Prefeitura, Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab) e com a Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar), haviam sinalizado a possibilidade de encontrar outro terreno para abrigar as famílias. No entanto, não houve respostas.
“O que deveríamos esperar era uma medida no sentido de frear a arbitrariedade do Judiciário, aliado ao poder das empresas que vem controlando o Estado. Não há respaldo do poder público pra indicar uma solução para as 800 famílias que estão no local, apenas esperar pela barbárie”, garante Malatesta.
Irregularidades
A Essencis tem o segundo maior aterro sanitário da capital, gerido por uma Central de Tratamento e Valorização Ambiental (CTVA). Sua área fica a pouco mais de um quilômetro da Bacia do Passaúna, represa que fornece água para as regiões oeste e sul de Curitiba e para o município de Araucária.
A tentativa de ampliação de seu terreno entra em choque com ações civis públicas, entre elas uma proposta pela Promotoria de Proteção ao Meio Ambiente, que questiona a expansão das atividades da empresa, já apontadas como irregulares por fraudes em licenças ambientais pelo Tribunal de Justiça.
Em 2015, a Essencis- que alega ser dona do terreno- conseguiu uma liminar de reintegração de posse, mesmo após a legalidade do contrato de sublocação da área em disputa estar sendo discutida na Justiça desde 2009. O contrato se dá com a massa falida da empresa Stirps Empreendimentos e Participações Ltda., sendo considerado nulo por decisão judicial da 2ª. Vara de Falências e Recuperações Judiciais. A liminar foi rejeitada em março de 2016.
“Essa nova pressão pelo despejo é mais uma manobra da Essencis, que, por não ser dona do terreno, teve a primeira liminar derrubada e agora tenta outra ação na Justiça”, denuncia a integrante do MTST PR.
Isabella Lanave/ R.U.A FotoColetivo
Mobilização
Em virtude da ameaça de despejo e das pressões por parte da massa falida da Stirps e da empresa Essencis, movimentos populares, entidades e organizações sociais emitiram nesta quarta-feira (25) uma Nota Pública em defesa da Ocupação Tiradentes. Além de criticar a falta de alternativas fornecidas pelo Estado às famílias, a nota questiona a demora na regulamentação da Lei do Aluguel Social (Lei 14.700/2015), sancionada em 2015 pelo prefeito Gustavo Fruet (PDT). Ela destina um benefício de até um salário-mínimo regional (R$ 1.032,02) e por até 24 meses a famílias de baixa renda, que não possuem imóvel próprio e que se encontram em situação habitacional de emergência. A lei deveria ter sido regulamentada até novembro de 2015.
“A situação se torna mais dramática diante do atual momento político e social. Com o crescente desemprego e a instabilidade econômica, as famílias não conseguem se manter pagando aluguel. Além disso, durante a tentativa de negociação para que essas pessoas não sejam simplesmente despejadas nas ruas sem qualquer ação que venha minimizar o problema, a COHAB Curitiba, a Prefeitura e o Governo do Estado não apresentaram qualquer proposta a não ser o despejo”, diz o texto.
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