Um mês e meio depois de o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmar que “a questão da água está resolvida”, referindo-se à crise hídrica que atingiu a Região Metropolitana de São Paulo em 2014 e 2015, o volume de chuvas de abril está sendo o pior já registrado nos 14 anos em que a Sabesp mantém histórico da pluviometria nos sistemas em sua página na internet. Desde o dia 1º, choveu apenas 7,7 milímetros (mm) no conjunto de seis reservatórios que abastecem a região. Cada milímetro de chuva corresponde a um litro de água por metro quadrado.
A pior situação é da represa de Guarapiranga, que não recebeu nem uma gota de chuva em 19 dias. O Sistema Rio Claro, que abastece bairros da zona leste da capital e dos municípios de Ribeirão Pires, Mauá e Santo André, teve a pior queda no volume de chuvas. De uma média de 201,5 mm no mês de abril, a represa recebeu somente 2,2 milímetros até agora.
O Cantareira, que quase secou no ano passado após o uso do volume morto das represas, recebeu apenas 0,9 mm de precipitação. Em 2013, antes de ser deflagrada a crise, o Cantareira teve 65,2 mm de chuva desde o dia 1º. Em 2014, foram 83,6 milímetros. Em 2015, a chuva foi bastante escassa: 16,1mm. Mas ainda assim superou este ano. Mesmo no pior período da crise hídrica, em 2015, os reservatórios registraram índices maiores de chuvas no mês de abril do que neste ano.
Além disso, os reservatórios ainda estão com um volume total de água inferior ao que tinham em 2013, antes de ser deflagrada a falta de água. Apesar da recuperação dos Sistemas Cantareira e Alto Tietê, hoje com 36,8% e 41,3% da capacidade, respectivamente, a Região Metropolitana de São Paulo tem menos água disponível no total, conforme o gráfico que segue. O Cantareira registrou hoje sua primeira queda no nível desde 15 de fevereiro: de 36,9% para 36,8%.
Para todo o mês de abril são esperados os seguintes volumes de chuvas: Cantareira, 88,7 mm; Anto Tietê, 97,8 mm; Guarapiranga, 73,2 mm; Alto Cotia, 80,0 mm; Rio Grande (Billings), 105,4 mm; Rio Claro, 201,5 mm.
“Essa situação só reforça a constatação de que o governador tem agido de forma completamente irresponsável para enfrentar a seca. Não superamos a crise e corremos o risco de voltar ao seu pior momento se não forem mantidas as medidas de redução de consumo”, afirmou o coordenador do Coletivo de Luta pela Água, Edson Aparecido. “A gente sabia que era impossível dizer isso que o Alckmin disse porque o período seco do ano nem tinha começado”, completou.
A Aliança pela Água, rede com 48 organizações que realiza ações sobre a seca em São Paulo, também criticou a postura do governador, em nota publicada no dia seguinte à declaração dele. “(A afirmação) mostra uma visão equivocada sobre segurança hídrica, induz ao aumento do consumo e, consequentemente, diminui a já frágil resiliência da Grande São Paulo para enfrentar novas crises. Inclusive porque a situação atual é melhor do que na mesma data em 2014 e 2015, mas ainda muito pior do que era entre 2010 e 2013, período anterior à crise”, defendeu a entidade.
O governo Alckmin, no entanto, foi na contramão das organizações. Vai encerrar as políticas de bônus e ônus nas contas de água, no próximo mês. O primeiro é aplicado a quem economizar entre 20% e 30% no consumo de água, recebendo descontos na tarifa. O ônus é uma multa aplicada a quem aumentar o uso de água. E que pode chegar a 100% do valor da conta para quem aumentar 30% no consumo. A Sabesp também reduziu a aplicação da redução de pressão nas tubulações, que deixou muitos moradores das zonas leste, norte e oeste sem água por até 48 horas no ano passado.
Também em maio, a companhia vai aplicar o reajuste tarifário anual, com aumento de 8,45% nas tarifas atuais, já autorizado pela Agência Reguladora de Saneamento e Energia de São Paulo (Arsesp). O consumo residencial normal de até 10 mil litros de água, somado ao lançamento de esgoto proporcional, vai passar dos atuais R$ 41,28 para R$ 44,78.
“O governo Alckmin não aprendeu nada com a seca. Continua tratando água como produto à venda, não como direito. O lucro da Sabesp caiu no período da crise. Agora eles querem reaver o dinheiro perdido. E fazem isso arriscando termos um período intenso de estiagem, como abril demonstra. Ao retirar ônus e bônus, e dizer que a crise foi superada, o governador estimula a população a gastar mais água”, disse Aparecido.
Segundo o balanço de 2015 da Sabesp, o lucro líquido da companhia foi 40,6% menor que em 2014. Foram R$ 536,3 milhões no ano passado, contra R$ 903 milhões no ano anterior. Antes da seca, em 2013, a estatal chegou a R$ 1,93 bilhão de lucro.
A Sabesp informou, por meio de nota, que "projeta abastecimento dentro da normalidade para 2016". A companhia avalia como "pequena" a probabilidade de repetição da seca ocorrida na crise. Além disso, "os mananciais têm hoje mais água em estoque e, graças à mudança de hábitos da população (redução do desperdício), retira-se atualmente uma quantidade de água dos mananciais inferior ao período pré-crise". Ainda segundo a empresa, após as obras realizadas, "é possível atender a muitas residências com água proveniente de mais de um sistema produtor".
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