Luta anticapacitista

2ª Parada do Orgulho PcD leva às ruas de SP conexão entre luta anticapacitista e demais pautas sociais

Com o tema 'Sônia Livre', evento traz à luz caso da mulher surda e negra que vive em condições análogas à escravidão

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
A primeira Parada do Orgulho PcD do Brasil ocorreu em 2023, na avenida Paulista - Foto: Leonardo Ripoll

A 2ª Parada do Orgulho PcD leva o tema "Sônia Livre" à cidade de São Paulo (SP) em 21 de setembro, Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência. O evento busca dar visibilidade às pessoas com deficiência, além de pedir a libertação de Sônia Maria de Jesus. Mulher surda, negra e analfabeta em português e libras, Sônia vive há 40 anos na casa de um desembargador em Florianópolis (SC), onde suas condições de trabalho foram apontadas como análogas à escravidão.

Meses após o resgate de Sônia, em 2023, a Justiça autorizou que ela voltasse a viver com a família que a escravizou. Os auditores fiscais do trabalho denominaram o caso como o primeiro de 'desresgate' no Brasil. "É no mínimo intrigante que esse fato hediondo tenha ocorrido justamente com uma pessoa com deficiência", afirma Marcelo Zig, diretor institucional do evento.

A partir do mote, o evento aponta para a importância da interseccionalidade entre a luta anticapacitista e outras causas sociais. "A pessoa com deficiência tem a sua identidade e experiência reduzida à deficiência, como uma característica que a destitui de humanidade. Dessa forma, ela não é acolhida em nenhum debate da vida social além da pauta da deficiência", aponta.

"Isso não quer dizer que não soframos com as estruturas de violências na sociedade, pois, nós, pessoas com deficiência, somos plurais, somos homens, mulheres, crianças, adultos, idosos, negros, brancos, indígenas, héteros, LGBTQIAP+, nós somos Sônia Maria de Jesus", completa Marcelo.


O evento aponta para a importância da interseccionalidade entre a luta anticapacitista e outras causas sociais / Foto: Leonardo Ripoll/Divulgação

Movimento político

Julia Piccolomini, presidenta da organização, reforça a necessidade urgente de combater racismo, machismo e capacitismo existentes na sociedade, tendo em vista que as mulheres negras idosas com deficiência são a maioria da população PcD. "Este caso ilustra o capacitismo violento existente e que tanto é invisibilizado. Há necessidade de políticas públicas mais eficazes para nos proteger. Somos seres humanos e temos direitos humanos", reivindica.

"Clamamos que o STJ e STF revejam suas decisões, a fim de garantir para Sônia, e a todas as pessoas vítimas de trabalho escravo, o direito ao trabalho decente e a uma vida sem violência perpetrada por conhecidos, pela comunidade ou pelo Estado", afirma Piccolomini.

Mayra Ribeiro de Oliveira, assistente social que acompanha a parada como assessora do mandato da deputada federal Sâmia Bomfim (Psol-SP), destaca a relevância política do evento, que deve encampar a campanha global "Liberdade por Sônia", exigindo que ela retorne à sua família. "Ter o tema 'Sônia livre' vai trazer para o evento uma caracterização mais política do quanto o Brasil é um país racista, machista e que trata pessoas com deficiência como objetos", diz.

Em ano de eleições municipais, a parada também deve levantar a importância de pessoas com deficiência estarem nos espaços de decisão. "Historicamente esses espaços vêm sendo retirados de nós", afirma. Ribeiro salienta ainda que a aliança política também vem através da participação de movimentos populares no evento. Já passaram por lá representantes da Frente de Pessoas com Deficiência do Movimento Esquerda Socialista, Comédia Sentada, Coletivo Feminista Helen Keller e Quilombo PcD.

"A gente brinca que não é só pé na porta: é a cadeirada na porta, a bengalada na porta, a muletada na porta", diz a assistente social, lembrando que há muito a avançar. "A parada vem aí com muita força, muita música, muita cultura, muito hip hop, para dizer que as pessoas com deficiência vão ocupar a rua".

Para além das ruas

Além de ocupar o espaço público para exigir inclusão social da comunidade PCD em toda a sua diversidade, a parada também realiza audiências públicas e seminários nas cidades por onde passa. 

Os eventos incluem debate local sobre a experiência das pessoas com deficiências e moções honrosas em reconhecimento de trabalhos protagonizados por elas e instituições parceiras. 

Uma das novidades desta edição é a 'Lojinha Parada PcD', onde serão vendidos produtos como bottons, adesivos e bandeiras. O valor arrecadado será revertido para fortalecer as ações do coletivo. "Teremos novos artistas, desfile de moda e muito mais. E caso você não tenha ido na primeira, esperamos que você também seja a nossa novidade", convida Julia.

Evento nacional

Em São Paulo, a parada acontecerá na Praça Franklin Roosevelt, na Bela Vista, com concentração a partir das 10h do sábado (21). Uma audiência pública também está marcada para ocorrer no dia 23 de setembro a partir das 9h na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e é aberta ao público.

A primeira Parada do Orgulho PcD do Brasil ocorreu em 2023, na avenida Paulista, reunindo mais de 250 pessoas. Neste ano, o evento passou também por Brasília, Salvador, Belo Horizonte e Recife. Em novembro, a edição deve chegar ao Rio de Janeiro. 

Segundo os organizadores, pessoas voluntárias com deficiência, o objetivo é seguir englobando mais localidades pelo país. "A parada segue e seguirá unindo a comunidade PcD, a promover a troca de experiências e criar uma rede de apoio, além de ganhar expandir a nosso alcance nas mídias, do público e de autoridades", completa a presidenta do evento. 

Edição: Rodrigo Gomes