Independência

7 de Setembro: governo tenta ressignificar desfile e leva pra avenida pautas como G20, Zé Gotinha e união nacional pelo RS

Adoção de elementos que evocam a ideia de união nacional foi feita diante de trauma na relação com militares

Brasília |
Lula durante desfile cívico-militar e em aceno ao público da Esplanada - Ricardo Stuckert/PR

Evento marcado historicamente por protocolos e ritos militares, o desfile do 7 de Setembro ganhou este ano um tom mais diversificado e arejado em Brasília (DF), com a adoção de elementos que evocam a ideia de união nacional e mobilizam o sentimento de nação a partir de referências menos tradicionais. O governo federal levou para a avenida diferentes abordagens, incluindo a ampliação do Mais Médicos e das campanhas de vacinação, a menção à atuação internacional do Brasil por meio do G20 e o esforço de reconstrução do Rio Grande do Sul após os últimos estragos climáticos.

Durante a cerimônia, o desfile presidencial, as marchas de grupos militares e o porte ostensivo de carros e aviões das Forças Armadas disputaram a atenção do público com os atletas brasileiros que competiram nos Jogos Olímpicos de Paris. Ao som de trompetes e tambores, uma banda oficial tentou conferir leveza à sonoridade do evento tocando hits como “Asa Branca”, de Luiz Gonzaga, e a canção “Tema da Vitória”, que marcou a história do esporte nacional por ser associada à figura de Ayrton Senna. O mascote Zé Gotinha, símbolo das campanhas de imunização, desfilou pelo segundo ano consecutivo e foi saudado pelo público das arquibancadas, inclusive por autoridades presentes.

“O conjunto foi muito representativo e significativo, pelas ações que estão sendo realizadas, desde o contexto de fortalecimento da pátria até as [políticas] de saúde e segurança nacional”, opina a enfermeira Vanessa Barroso Kuruaya, que atua no Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS). O desfile também atraiu outros indígenas, como é o caso de Aracaí Pataxó, que se somou a um pequeno enxame de apoiadores que se concentraram no entorno de Lula durante a saída do presidente, ocasião em que o petista decidiu parar e cumprimentar o público de perto. “Dei meu brinco pro Lula e ele me beijou. Eu abracei o presidente. Já esperava que ele fosse falar com o público e aproveitei pra abraçá-lo. Acho que foi inteligente da parte dele fazer isso porque também é um momento único pra gente conseguir chegar perto dele.”


Indígenas Vanessa Barroso Kuruaya e Aracaí Pataxó conferiram o desfile acompanhada de amigas / Cristiane Sampaio/Brasil de Fato

A menção ao Rio Grande do Sul contou com a participação de representantes de diversos agentes e órgãos públicos envolvidos na cadeia de serviços voltados à população gaúcha, desde tropas do Exército até integrantes do Corpo de Bombeiros, da Defesa Civil e de outras frentes. A ideia de celebrar a união de forças em prol do povo gaúcho agradou o bancário Marcos Ramos dos Santos, que veio ao evento pela segunda vez.

“Era importante [fazer isso] porque o povo brasileiro é um povo unido. A gente tem que se unir com os irmãos que estão sofrendo. Espero que agora tenhamos a capacidade de fazer o mesmo para combater as queimadas”, manifestou. Santos também disse ver com bons olhos a ideia de se elaborar o 7 de Setembro a partir da junção de militares com grupos e símbolos civis que não têm ligação direta com a cerimônia, como é o caso dos atletas que entraram na avenida e das referências ao SUS. “Achei perfeito. Nós somos progressistas e inclusivos. Todo mundo tem que fazer parte.” 


Evento oficial na Esplanada dos Ministérios reuniu cerca de 30 mil pessoas, segundo PM do Distrito Federal / Bruno Peres/Agência Brasil

Esposa de Santos, a também bancária Ana Mércia se disse encantada com as atrações que passaram diante das 30 mil pessoas concentradas nas arquibancadas. “Ano passado não consegui ver o evento direito, mas este ano a estrutura ficou melhor e a programação, também. Achei até mais organizado. E fico aliviada em ver que a cultura da vacinação voltou.” Cheio de expectativas desde antes do início da programação, o pequeno Nikolas Victor, de 9 anos, também aprovou o desfile, que ele conferiu pelo quinto ano. “Gostei de ver os aviões, que são sempre a melhor parte de tudo.”

Política

O presidente Lula (PT) esteve acompanhado de um conjunto de autoridades dos três Poderes. Da Esplanada, compareceram os ministros José Múcio Monteiro (Defesa), Paulo Pimenta (Secom), Ricardo Lewandowski (Justiça), Cida Gonçalves (Mulheres), Waldez Góes (Integração e Desenvolvimento Regional), Marina Silva (Meio Ambiente), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia), entre outros. O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, e o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, também se somaram ao grupo. Já o Supremo Tribunal Federal (STF) foi representado pelo presidente, Luís Roberto Barroso, e pelos ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Cristiano Zannin e Edson Fachin.


Lula [à direita] com Geraldo Alckmin ao lado / Ricardo Stuckert/PR

O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), aliado de Jair Bolsonaro (PL) e pivô de um dos principais pontos de atrito envolvendo a segurança pública no 8 de janeiro, também apareceu no evento. Em virtude da homenagem ao Rio Grande do Sul, o governador do estado, Eduardo Leite (PSDB), foi outra autoridade presente.

Diante dos holofotes e também nos bastidores, chamou a atenção a ausência dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e da Igualdade Racial, Anielle Franco. A primeira-dama, Janja da Silva, também não compareceu. Ela está no Catar, onde participa da 5ª Celebração do Dia Internacional para Proteger a Educação de Ataques. A esposa do presidente da República viajou a convite da xeica do país, Mozha bin Nasser al-Missned. A ausência de Anielle e Janja vem após o escândalo envolvendo o agora ex-ministro dos Direitos Humanos Sílvio Almeida, cuja situação gerou desgaste político para a gestão Lula.

Edição: Nathallia Fonseca