'fora do rito'?

Oposição prepara pedido de impeachment de Moraes no Senado; Pacheco fala em 'chance zero'

Presidente do Senado avisa que pedido não avançará, e juristas não veem ilegalidades na conduta de ministro do STF

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Moraes: "todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF" - Valter Campanato/Agência Brasil

Opositores ao governo no Congresso preparam um pedido de impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes após a Folha de S.Paulo publicar reportagens indicando que ele teria solicitado informações da Justiça Eleitoral para tomar medidas contra bolsonaristas em inquéritos criminais. Moraes já declarou que agiu legalmente.

A primeira reportagem da Folha foi divulgada na tarde de terça-feira (13). Depois disso, deputados e senadores declararam que vão trabalhar para que Moraes seja destituído do seu cargo no Supremo – algo que depende primeiramente de um processo no Senado.

Senadores alinhados à direita disseram que o pedido de impeachment não deve ser protocolado no curto prazo. Antes disso, eles devem, inclusive, promover um abaixo-assinado de apoio à solicitação entre os participantes de atos políticos do 7 de setembro.

Chance zero

O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), avisou a interlocutores, nesta quarta-feira (14), que a chance do processo prosperar é "zero". Pacheco controla a pauta do Senado. Dependeria dele, portanto, abrir um eventual processo de impeachment após a coleta de assinaturas para tanto.

Além disso, segundo juristas, o impeachment não deve proceder, pois Moraes não agiu irregularmente ao pedir informações da Justiça Eleitoral para utilizá-las em inquéritos que tramitam no STF. Moraes foi presidente do TSE durante a última eleição. Também preside no Supremo inquéritos sobre fake news e milícias digitais, que investigam bolsonaristas.

Tânia Oliveira, da Associação Brasileira de Juristas Pela Democracia (ABJD), disse que a lei prevê que o juiz eleitoral tem poder de polícia. Por isso, "o compartilhamento de informação dos crimes eleitorais não tem qualquer ilegalidade, até porque um crime eleitoral pode potencialmente também ser um crime comum".

"O ministro Alexandre Moraes era o presidente do TSE durante as eleições. Ele é o presidente dos inquéritos tanto das fake news como das milícias digitais. Ele requisitou as informações ao TSE sobre os crimes eleitorais cometidos sobre pessoas que eram aliadas do Jair Bolsonaro para efeito de investigação dentro do inquérito das milícias digitais. Qual é a ilegalidade que tem nisso? Nenhuma", resumiu.

Mais argumentos

O advogado Fernando Neisser, professor de Direito Eleitoral, publicou um artigo nesta quarta-feira (14) no qual defende a conduta de Moraes. Ele reforçou que "não há formalidade prevista para o exercício do poder de polícia de que dispõe o juiz (ou ministro) eleitoral".

"Nada impede que informações, produzidas de forma legal, sejam encaminhadas à relatoria de outros expedientes, como no caso de inquéritos policiais", acrescentou Neisser. "Isso porque, para uso futuro em ações penais, os elementos indiciários serão submetidos ao crivo do contraditório", concluiu.

Para os dois especialistas, é natural que a oposição se mobilize pelo impeachment de Moraes tentando até fazer um paralelo com o caso do vazamento de conversas da Lava Jato que levou à anulação das condenações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para Neisser, há diferenças entre a Vaza Jato e o caso Moares. A principal delas é o uso de conversas para acusar.

"Na Vaza Jato, você tinha conversas obtidas por uma fonte ilícita, mas elas foram usadas como provas de defesa. A jurisprudência não permite usar provas ilegais para acusação, que seria o caso de um pedido de impeachment", explicou. "Portanto, eu não vejo viabilidade jurídica nenhuma, e o correto seria o arquivamento imediato do pedido."

Questionamentos

A atuação de Moraes virou alvo de questionamentos porque, segundo a Folha, ele acionou, de forma não oficial, órgãos da Justiça Eleitoral para produção de relatórios que embasariam suas decisões no STF.

A reportagem da Folha de S.Paulo é baseada em trocas de mensagens entre assessores de Moraes, obtidas pelo jornal. Essas mensagens teriam sido trocadas entre agosto de 2022 e maio de 2023, o que, em parte, envolve o período eleitoral.

Segundo a Folha, Moraes "pedia informalmente via WhatsApp ao funcionário do TSE relatórios específicos contra aliados de Bolsonaro". "Esses documentos eram enviados da Justiça Eleitoral para o inquérito das fake news, no STF", descreve o jornal.

Ainda segundo a reportagem, ao menos parte dos documentos produzidos pela Justiça Eleitoral "foi usada pelo ministro para embasar medidas criminais contra bolsonaristas, como cancelamento de passaportes, bloqueio de redes sociais e intimações".

O gabinete de Moraes declarou que, "no curso das investigações do inquérito 4781 (das fake news) e do inquérito 4878 (das milícias digitais), nos termos regimentais, diversas determinações, requisições e solicitações foram feitas a inúmeros órgãos, inclusive ao Tribunal Superior Eleitoral".

Segundo o gabinete, o TSE, "no exercício do poder de polícia, tem competência para a realização de relatórios sobre atividades ilícitas, como desinformação, discursos de ódio eleitoral, tentativa de golpe de Estado e atentado à Democracia e às Instituições".

"Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria Geral da República", concluiu o órgão.

Políticos se pronunciam

Algumas personalidades políticas também se posicionaram em defesa da postura de Moraes. "'Fora do rito', de qualquer rito, estavam Bolsonaro e seus cúmplices, mentindo sobre o processo eleitoral, ameaçando as instituições e urdindo um golpe contra a posse de Lula, o eleito", declarou a deputada Gleisi Hoffmann, presidente PT.

Rogério Correia, vice-líder do governo na Câmara, declarou que "Alexandre de Moraes atuou para evitar crimes eleitorais, garantir a lisura do pleito de 2022 e evitar o golpe bolsonarista anunciado e tentado em 8 de janeiro".

Edição: Martina Medina