As operações policiais no Rio de Janeiro afetam o cotidiano de milhares de famílias, trabalhadores e estudantes. São escolas, creches e postos de saúde que, por medida de segurança, fecham as portas em dia de incursão.
Diante deste cenário, o Ministério Público Federal (MPF) expediu um ofício à Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC) solicitando informações sobre a existência de diretriz nacional sobre o impacto das operações policiais no sistema educacional e formas de reparação.
Segundo o órgão, o objetivo é discutir a possibilidade de fixação dessas diretrizes em vista da ausência de uma padronização nacional. Além disso, é necessário estabelecer regras sobre a reposição de aulas e dever de compensar os dias perdidos. O ofício foi encaminhado pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC).
Dados da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, que constam em procedimento instaurado pelo MPF apontam que, entre 2022 e o primeiro semestre de 2023, foram registradas mais de 832 ocorrências de operações policiais só na capital. As comunicações de operações às escolas são feitas, em alguns casos, via e-mail ou pelo Whatsapp.
Leia mais: MPF pede federalização de casos de violência policial no estado do Rio de Janeiro
Já a Polícia Militar do estado do Rio (PM-RJ) informou ao MPF que, no mesmo período, foram realizadas 522 operações em horário escolar na capital, com destaque para a zona norte, em bairros como Bangu, Jardim América, Madureira, Maré, Parada de Lucas, Pavuna e Penha. Os números da Polícia Civil mostram que, entre janeiro de 2022 e setembro de 2023, foram comunicadas 121 operações no interior de comunidades em horário escolar.
Outras cidades
Já o município de Itaboraí, na região metropolitana do Rio, o MPF averiguou que as escolas não são comunicadas das operações e, quando percebem alguma movimentação estranha, precisam entrar em contato com Secretaria de Segurança Pública para buscar informações.
As operações em áreas escolares não são incomuns na cidade, que se tornou o município da região metropolitana com maior número de comunicação de operações policiais próximas a escolas, com 49 casos, seguida por Japeri (37) e São João de Meriti (29). Em dezembro de 2022, uma troca de tiros entre a polícia e criminosos, próxima a uma creche municipal, resultou na morte do faxineiro Geraldo de Almeida.
O levantamento aponta ainda que as escolas em Duque de Caxias, na baixada fluminense, tiveram as aulas suspensas/interrompidas por 136 dias durante o ano letivo por conta das operações policiais. Enquanto no município de Magé, também na baixada, os alunos ficaram durante um mês do ano letivo com aulas remotas para a segurança da comunidade escolar.
Esses dados estão reunidos em procedimento em tramitação na PRDC-RJ que acompanha o cumprimento da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Favela Nova Brasília. Na ocasião, o Brasil foi condenado pela primeira vez, em âmbito internacional, por reconhecida violência e negligência policial, no Caso Favela Nova Brasília. Duas operações policiais em 1994 e 1995 na comunidade que fica no Complexo do Alemão, na zona norte do Rio, resultaram em 26 homens vítimas de homicídio e três mulheres vítimas de violência sexual.
O órgão busca também estimular o debate público sobre o monitoramento e acompanhamento das decisões proferidas na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
"Há pouca clareza na prestação de informações quanto ao cumprimento das decisões proferidas na ADPF 635, por isso mesmo, a PRDC insta o MEC a discutir a fixação de diretrizes nacionais que impactam na educação com a realização de operações policiais em áreas escolares”, ressalta o procurador regional dos Direitos do Cidadão adjunto Julio José Araujo Junior.
Edição: Jaqueline Deister